domingo, 10 de janeiro de 2016

Elle est morte






Frágil, com aquela fragilidade típica da idade, sentava-se no banco do jardim , sempre no mesmo banco, no no Lar de Terceira idade na Venda do Pinheiro.
Não gostei que a família a tivesse retirado da casa onde vivia, há mais de 50 anos, que a tivessem  levado para um ambiente que nada tinha a ver com Ela , um exílio na periferia de Lisboa. Era uma decisão que eu não podia alterar.
O cabelo branco sempre bem penteado, os olhos encovados , cansados de tanta leitura, a voz firme, e um sorriso doce, sempre doce e permanente.
Nasceu como costumava dizer, na terra de Elmano Sadino, com raízes em Elvas, estudou em Lisboa na faculdade de letras, onde se licenciou, foi colega da Mª de Jesus Barroso de David M.Ferreira, Matilde Rosa Araújo e de tantas outras figuras ilustres.Optou sempre por ser apenas professora.
Dizem que ficou solteira, por uma paixão de juventude, que curou na Serra da Arrábida.
Não faltava a uma corrida no Campo Pequeno. Sector 1 contra-barreira.
Ensinou-me muito, quase tudo o que sei de Francês e muito do que sei sobre literatura, mas sobretudo humanidades, para não falar de condução.
Na sua casa das Avenidas Novas com 12 assoalhadas,tinha uma sala onde dava explicações a meia Lisboa.
Ás vezes dormia lá em casa , não se deitava antes das 2  da manhã e cedo preparava farinha Pensal e uma carcaça com fiambre. Não me atrevia  rejeitar.
Foi  uma das pessoas mais importantes na minha vida.
Não sei porque me lembrei de evocar a sua memória hoje, mas soube-me bem.
Obrigado M.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Triste Feia

                                          com 50 anos de distância quase nada mudou
Junto a Estação de  Alcântara Terra e encostada a rua do Costa, está entalada  a Triste Feia.
Várias vezes pensei neste nome tão peculiar, da toponímia Lisboeta.
Porque raio se chamaria a esta rua sem saída, Triste Feia. Investiguei e fiquei a saber que em 1770 já constava da relação das ruas de Lisboa, esta "Triste Feya".
Appio Sottomayor esclarece :
"Da mulher que foi a Triste Feia não se sabe o nome exacto nem, rigorosamente, o tempo em que viveu. O que se sabe ao certo é que foi o povo, foram os seus vizinhos quem imortalizou as suas características. Diz a tradição que ali moraram três irmãs, sendo duas delas raparigas normais e com o viço próprio dos verdes anos; a terceira, porém, possuía feições tão pouco agradáveis à vista que os rapazes que passavam em busca de conversadas fugiam comentando: ‘que focinho de porca!’,"
Pois se a rapariga era feia, como não havia de ser triste?
Posso mesmo imaginar a rapaziada, que pelo vale de Alcântara chegava a Lisboa no século XVIII , teria já esta referência, " Cuidado com as manas , duas são valentes,  mas a terceira tem focinho de porca"

domingo, 3 de janeiro de 2016

Toma conta de mim



É tarde, vejo televisão , Pedro Abrunhosa canta uma música chamada "toma conta de mim". Agarro-me aos meus pensamentos , regurgito memórias, e tu entras-te nos meus pensamentos sem pedir autorização.  
Há quase seis anos que não nos vemos. 
Comecei , nos primeiros tempos, por te ver no carro com quem me cruzava.
Ás vezes pegava no telefone para te dizer que acabaramos de nos cuzar, ou apenas para falarmos.
Depois de algum tempo, eram os sítios, como os , em que costumava-mos almoçar ou ir tratar do barco. 
Uma coisa te confesso, nunca conseguiste estar muito tempo fora dos meus pensamentos. Afinal a amizade é assim. Tem principio mas não tem fim.
Lá onde agora moras não imagino o que fazes.
Tens uma vantagem, não envelheces.
Mas duvido que tenhas mudado muito. 
Quero te dizer, que não me aborreço por entrares sem aviso nos meus pensamentos.
Na noite de fim de ano, lembrei-me do teu sorriso, sarcástico, quando falavas no "Kit de felicidade", com que os restaurantes dos hoteis, presenteiam os clientes e que se compunha de um "chapelinho de papel e de uma lingua da sogra" sorri também. 
Estas à vontade , vai aparecendo nas minhas memórias.
É sempre um prazer lembrar-te.
Toma conta de mim lá onde moras.